“Estou celebrando um contrato com meu esposo e quero estipular um benefício ao nosso filho, de modo que meu esposo me prometa que irá doar ao nosso único filho o imóvel X que acabamos de adquirir, é possível?”
A principio, tem-se a restrição dos efeitos de um contrato a terceiros que não participaram de suas estipulações, isso porque os direitos e obrigações decorrentes do contrato atingem somente àqueles que o assinaram, com base no princípio da relatividade dos efeitos do contrato. Entretanto, como muitos institutos do Direito, o principio pode ser relativizado/mitigado.
Dentre outras possibilidades, temos a ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO, prevista pelo Código Civil Brasileiro, nos artigos 436 e 438, ocorrendo quando uma pessoa convenciona com outra certa vantagem em beneficio de terceiro, que não toma parte no contrato.
E olha o ponto interessante: as partes envolvidas agem em nome próprio, identificando o terceiro, o o beneficio e sua gratuidade, isso porque não pode haver a imposição de contraprestação. Nesse tipo de estipulação temos:
- ESTIPULANTE: quem estipula que a outra parte terá que realizar uma obrigação em favor de terceiro.
- PROMITENTE: devedor; quem se compromete a realizar a obrigação em favor de terceiro.
- TERCEIRO: quem não integra o polo, mas é beneficiário do contrato firmado entre as partes anteriores.
O que se determina é a possibilidade de duas pessoas celebrarem um contrato e preverem um benefício em favor de terceira pessoa não integrante da relação.
Veja que, no primeiro momento, o terceiro nem precisa dar ciência de seu consentimento à estipulação, sendo, do mesmo modo, possível a recusa pelo terceiro em receber o objeto determinado em seu favor.
Atenção: a existência e validade do negócio não dependem da aceitação. Já a eficácia do negócio DEPENDE da aceitação, isso porque só produzirá efeitos se o terceiro aceitar receber o benefício.
Tudo lindo, mas quem pode exigir essa obrigação?
Pode ser exigida tanto pelo estipulante quanto pelo beneficiário. E aqui existe um porém!
O Código Civil prevê que ao terceiro, em favor de quem se estipulou a obrigação, também é permitido exigi-la, ficando, todavia, sujeito às condições e normas do contrato, se a ele anuir,e o estipulante não se reservar o direito de substituir o terceiro designado no contrato.
E, completando, Carlos Roberto, no livro Direito Civil Esquematizado, leciona que:
No silêncio do contrato, o estipulante pode substituir o beneficiário, não se exigindo para tanto nenhuma formalidade, a não ser a comunicação ao promitente, para que este saiba a quem deve efetuar o pagamento.
Basta, portanto, a declaração de vontade do estipulante, por ato inter vivos ou mortis causa, como previsto no parágrafo único do art. 438 supratranscrito.
O Direito Contratual parte da premissa de LIBERDADE entre as partes, AUTONOMIA de cada parte e, principalmente, BOA-FÉ na relação, desde a sua fase pré-contratual até a pós-contratual.
Dessa forma, apesar da regra ser pela relatividade dos efeitos do contrato, é totalmente possível que as partes, de comum acordo e sem qualquer vício de vontade, estipulem como benefício o objeto contratual em favor de terceiro – cabendo, somente no segundo momento, sua aceitação ou não.